segunda-feira, 30 de março de 2015

A INVASÃO

Até os idos dos anos 70 do século passado, não era comum o torcedor frequentar estádios de futebol, vestindo a camisa do seu time. As bandeiras sempre foram o foco. Ao contrário das camisas, para serem confeccionadas, bastavam alguns tecidos, linha, um mastro, mesmo que pequeno, e um bom ou uma boa costureira. Camisa era coisa para uns poucos privilegiados. A oferta era muito limitada, encarecendo o produto. Era preciso conhecer alguém de dentro do clube para obter a "preciosidade". Desta forma, o torcedor preferia poupar para ter o dinheiro do ingresso do jogo, sempre "baratinho". E, considerando as multidões que compareciam ao Maracanã, por exemplo, sempre na casa dos 100 mil, os clubes tinham 2 grandes fontes de renda: o ingresso e as excursões à Europa, durante a pré-temporada do Velho Continente. Às vezes, a venda de jogadores também colocava uma grana no caixa, sobretudo com alguns poucos, mais famosos, que foram para a Europa, antes dessa época, como Evaristo de Macedo, Canário, Didi, Julinho Botelho, Waldo, Amarildo. E mais tarde com Jairzinho, Paulo Cézar, Luis Pereira e Leivinha. Vender camisas ou qualquer outro dito produto oficial, definitivamente, não era fonte de receita.

Torcidas do Rio! Vamos botar a camisa?
Gradativamente, isso foi mudando. Ao final dos anos 70, ainda era raro encontrar torcedores com camisas oficiais, mas as "piratas" começaram a tomar conta do mercado. No entorno do Maracanã, já se viam os camelôs vendendo as camisas 10 do Flamengo (Zico) e do Vasco (Roberto), a 5 do Fluminense (Edinho) e a eterna 7 do Botafogo! Ao mesmo tempo, as torcidas organizadas, muitas fundadas há pouco tempo e quando ainda eram organizadas, lançavam seus próprios uniformes e iniciavam o processo de colorização da arquibancada.

E o processo não parou mais! Na Copa de 1974, a Adidas começou a aparecer nos uniformes da Alemanha/OC, Holanda, Polônia, Argentina, Suécia, Iugoslávia e até do Zaire! Quatro anos depois, estava na seleção brasileira e já vestia o Guarani e o Palmeiras, respectivamente, campeão e vice brasileiros deste ano, além do Internacional. No ano seguinte, Fluminense e Vasco.

Na virada dos 80, as camisas oficiais dos times brasileiros ainda não eram comercializadas. Em compensação, as do tipo "genéricas" eram encontradas com facilidade nas lojas esportivas, uma vez que não existia o conceito de produto licenciado oficial. E nessa década, outras marcas começaram a dividir o mercado com a Adidas: Penalty, Topper (na seleção em 82/86/90), Le Coq Sportif, Olympikus, Rainha.

Nos anos 90, vieram a Umbro (na seleção em 94), a Reebok e a Nike (na seleção de 98 até hoje). E junto, uma nova prática: a marca exposta como fonte de receita, ou seja, os clubes começaram a receber para vestir as marcas, via contrato de fornecimento. Então, naturalmente, surge o conceito do produto licenciado e o acesso às camisas oficiais, definitivamente aberto! Os preços, ainda hoje, continuam altos, mas as facilidades de pagamento, além do comércio eletrônico, fizeram - e continuam a fazer - com que este tipo de venda passasse a ter certa relevância na receita dos clubes. E, claro, os piratas continuam! Mais baratos, né?

Entretanto, junto ao acesso às camisas oficiais dos times brasileiros, também estava aberto o mercado internacional, cujos times vestem as mesmas marcas. Após a entrada do real, como nova moeda em 1994, e a estabilização da nossa economia, as viagens ao exterior passaram a ficar mais acessíveis à classe média brasileira e, para quem gosta de futebol, passou a ser um grande barato comprar camisas dos times e seleções estrangeiras nas lojas de lá! Imagina, trazer de presente para um filho ou sobrinho (ou comprar para si mesmo), uma camisa do Arsenal comprada em Londres, uma do Real comprada em Madrid, uma do Milan comprada em Milão, uma do PSG comprada em Paris! Maneiro demais! Presentaço!

As marcas não perderam tempo. Não há nada mais fácil hoje em dia do que entrar em qualquer site brasileiro de venda de artigos esportivos e adquirir camisas oficiais de times e seleções do mundo inteiro pelo mesmo preço dos brasileiros, pagando em reais, no cartão de crédito, em até 10 vezes sem juros, muitas em promoção, aplicando nome e número nas costas, com entrega a domicílio em 3 ou 4 dias! E o que aconteceu?

A tal da concorrência! E pra lá de desleal! Ao mesmo tempo em que o nosso futebol se afasta cada vez mais da torcida brasileira (ou alguém duvida que atualmente Londres não seja a "casa" da seleção?) e sua qualidade definha a níveis medidos pelos 7 a 1  da vida, somos "contaminados" pelos vinte e tantos campeonatos estrangeiros, cujos jogos são transmitidos ao vivo pela TV, com resenhas detalhadas, todos os gols da rodada, com direito a replay. E o pior (pra nós): os jogos são mesmo espetaculares, anos-luz melhores que os nossos!
As minhas - 2

As minhas - 1
Resultado: os meninos (e meninas) dos 6 (ou 5, ou 4) aos não-sei-quantos-anos comparecem à aniversários, churrascos ou treinos de futebol vestidos com as camisas do... Arsenal, Real Madrid, Milan e Paris SG, embora torçam para Botafogo, Flamengo, Fluminense e Vasco, aqui no Rio, claro!

O problema está cada vez mais próximo de nós! Aqui na minha casa mesmo! Não somente com meu filho de quase 10 anos, mas também comigo! Muito provavelmente, também ai na sua casa, amigo leitor! É uma invasão!


As do Pedro! Loucura!
É preciso resistir!

Papo para o próximo post!

2 comentários:

  1. Purarealidade Osmar!
    Nossos filhos já entendem qual o verdadeiro futebol nos dias de hoje.

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    1. Não perca o próximo post! Minha receita para resistir!!! Hehehe! Abraço

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