terça-feira, 7 de janeiro de 2014

O PANTERA NEGRA DE LOURENÇO MARQUES

Lá pelo início dos anos 80 (acho que em 83), meu pai estava costeando a África meridional, fazendo a rota do Japão, no seu ofício da Marinha Mercante brasileira. Eu tinha 15 ou 16 anos. O Oceano Índico não é aconselhável de ser atravessado devido as suas famosas tormentas. Ou seja, a rota de Vasco da Gama para as Índias ainda é a mais segura. Telefonar do navio para casa era outra tormenta. Imaginem da África. Sem internet, sem smartphone, sem whatsapp...E numa noite, ele ligou. Eu atendi.

"Oi pai! Tá onde?"
"Em Moçambique, filho. Sabe onde fica?"
"Sim. Na África, né? De frente pra Madagascar!" 
"Isso mesmo! Tô griiiii...priiiiii...xiiiiiii... puto!" A ligação era péssima! E eu estranhei pois meu pai não é de falar palavrão... mas arrisquei:
"O que pai? Vc tá puto com o que?" 
Ele esbravejou: "Nããããoooo! Es-tou em MA-PU-TO!" 
"O que é isso, pai?"
"A Capital de Moçambique, MA-PU-TO!" 
"Caramba! Putz Grila!" (como percebi que ele não havia dito palavrão, não podia dizer Caral#@&! PQP!)
"Você sabe por que Moçambique é um país famoso?"
"Bem, não foi aí que nasceu o Eusébio, jogador português?"
"Isso mesmo! Só que na época a cidade se chamava Lourenço Marques..."

Minha mãe não aguentou aquele papo furado de futebol e me tirou o telefone! Imagina, pagar aqueles pulsos caríssimos pra Telerj e ela ali esperando...

Uma das duas grandes colônias portuguesas na África, Angola no Atlântico era a outra, Moçambique se tornou independente em 1975 e Lourenço Marques era o nome do explorador e comerciante lusitano que primeiro se instalou ali, em 1544. O Rei Dom João III, então, não teve dúvidas e batizou a cidade em sua homenagem. O nome Maputo foi, na verdade, reutilizado, uma vez que dava - e ainda dá - o nome da baía onde a cidade foi fundada.
Vista aérea de MA-PU-TO
Aos 17, pelo Sporting L.Marques
Eusébio nasceu em Lourenço Marques em 1942. E das peladas na favela onde foi criado e da liga amadora de Moçambique, não demorou para cruzar o continente africano e desembarcar na capital da metrópole aos 18 anos, contratado pelo Benfica. E dali para a seleção portuguesa, já no ano seguinte. Afinal, não havia dúvidas quanto a sua cidadania, tema tão polêmico hoje em dia.

E é exatamente neste tema que a trajetória do "Pantera Negra" me chama mais atenção. Durante toda a sua carreira de recordes, gols e títulos, seja com os "Encarnados" ou com a "Selecção Nacional", seu país natal nunca foi Portugal mas era como se fosse. Durante 15 anos, Eusébio conquistou os torcedores da metrópole com simplicidade, boa educação, carisma e um futebol excepcional. Deixou Lisboa exatamente no ano em que Moçambique conquistou sua independência política e foi ganhar dinheiro nos EUA. Como Pelé.
   
Se Pelé teve sua majestade contestada por alguns "espíritos de porco", foi devido a Eusébio. A rivalidade dentro de campo foi transformada em grande amizade fora dele. E começou com o massacre do Santos sobre o Benfica, na decisão da Copa Intercontinental, em 1962. No Estádio da Luz, Pelé, Pepe, Coutinho, Zito, Mengálvio, Dorval massacraram os encarnados: 5x2. O troco veio na Copa de 66, Estádio do Everton, Liverpool, Inglaterra. Eusébio fez dois na vitória por 3x1 que eliminou o Brasil ainda na primeira fase. Pelé não estava 100% fisicamente e o zagueiro português Morais tratou de tirá-lo definitivamente do jogo. Como não havia substituição, Pelé apenas fez número em campo. Eusébio seria o artilheiro da Copa, levando Portugal ao 3o.lugar, após perder a semifinal para a Inglaterra.
Mais de 700 "golos" de sua carreira, muitos com a "camisola" encarnada! Abaixo, documentário da FIFA!


Eusébio ainda jogaria a Mini-Copa, em 1972, no Brasil, torneio que a ditadura militar criou para celebrar os 150 anos da independência. Brasil e Portugal fizeram a final no Maracanã mas Pelé já havia se retirado da seleção no ano anterior. E fomos campeões: 1x0, gol de Jairzinho de cabeça.

Parafraseando Getúlio Vargas em sua carta-testamento, Eusébio tirou o futebol de Portugal do ostracismo para colocá-lo na História. Antes de 66, não havia disputado nenhuma Copa e depois dele, chegou somente 20 anos depois, no México. Aí veio a geração de Figo, João Pinto, Pauletta e Cristiano Ronaldo!

Homenagens póstumas em sua estátua no Estádio da Luz
O futebol perde mais um dos seus maiores jogadores em todos os tempos! 
Todavia, São Pedro vibra! Eusébio será marcado por Djalma e Nilton Santos na pelada do céu!
Vai ter pay per view?

3 comentários:

  1. Excelente texto!
    Estive em Lisboa no mês de outubro passado e pude perceber o quanto o Pantera Negra é venerado na cidade e, sobretudo, no Benfica. Tanto é verdade, que o Eusébio tem uma cadeira particular na Tribuna de Honra do Estádio da Luz, ao lado do Presidente do Clube e, provavelmente, agora, este Cadeira ficará sempre vaga, com alguma menção à ele, para eternizar a presença do ídolo! bj

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  2. Amigo Osmar, muito legal este apanhado histórico. Realmente a trajetória do Eusébio foi espetacular. Pena não ter visto este craque jogar... abs!

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  3. Tenho que criar um cartão de fidelidade do blog para ambos!!! Eh!Eh! Valeu!

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