terça-feira, 12 de novembro de 2013

UMA VIDA EM MIL DÓLARES

Recebi neste fim-de-semana o tal email da FIFA, lamentando muito o fato de eu não ter sido sorteado para comprar ingressos da Copa do Mundo no ano que vem e blá-blá-blá...

Claro que fiquei decepcionado, como a maioria de meus amigos e familiares, embora alguns deles tenham sido contemplados; muitos parcialmente. Não dá para acreditar ou desacreditar nos critérios deste sorteio que ninguém sabe, ninguém viu. Vamos ver o que vai acontecer com uma das mais antigas profissões que existem desde que o mundo é mundo: os cambistas! A primeira foi aquela cobra que ofereceu a maçã, imediatamente comprada por Eva. A fruta não era um produto de consumo oficial divino! Lá foi o Adão comprar umas folhinhas para se cobrir. E ainda gastou mais pra Eva. Tinha a parte de cima!

Os cambistas me fazem voltar a 1998. Desde o ano anterior, fiz todo o meu planejamento de investimentos para me dar de presente o meu maior sonho: ver o Brasil em uma Copa do Mundo! E seria na França! Ainda não conhecia a Europa! Apenas passei uma semana na Holanda, a trabalho, em 1990, pela KLM! Zerei todas a minhas economias! Absolutamente todas! Só não vendi o carro!

E como comprar ingressos? Anúncio de jornal, telefonemas de amigos, agências de viagens. Muito difícil! A FIFA ainda não fazia o tal sorteio. Mesmo as operadoras de turismo tinham dificuldade para garantir ingressos. Até que não teve jeito: cambistas. Internacionais.

A ideia era ver os 3 jogos iniciais do Brasil. A abertura no novo estádio de Saint-Denis contra a Escócia, o Marrocos em Nantes e a Noruega em Marselha. Minhas economias só davam pra isso! E tava bom demais! Descobri uma agência em Copacabana que tinha os três. Chegando lá, passei por alguns "armários" seguranças e fui recebido numa salinha no fundo da loja! Parecia à prova de som! Com ingressos destinados à CBF, lugares chinfrins, os 3 custavam 1000 dólares, ao câmbio azul de tão negro!!!O valor oficial na época não passava de 50 dólares cada! Com um detalhe: o ingresso do Marrocos só seria entregue em Paris, em local que ainda seria definido na véspera de viajar! Teria que dizer a eles em qual hotel eu ficaria para que o mensageiro deixasse um recado na recepção com o endereço de onde buscá-lo. Fiquei gelado, trêmulo, pálido! Olhei pro céu e paguei! Se Deus é por nós, quem seria contra nós?

Paris! Chegando no hotel, nenhum recado na recepção! Nada no segundo dia! Fui rezar em Notre Dame! E no terceiro dia, lá estava o endereço! Me senti um James Bond, um Sherlock Holmes, um Hercule Poirot, até mesmo um Inspetor Clouseau em missão secreta! Depois de várias conexões pelo metrô, descobri que o hotel do "mensageiro" era uma espelunca, tipo meia estrela, em um bairro fétido, com lixo pela rua, tipos mal encarados, ao norte, já saindo da cidade! Era de manhã, tipo 10 horas e o sujeito com cara de sono me deu o envelope dourado!!! Os 3 em mãos! Mas seriam "quentes"? Muita "neura", né?

Véspera da abertura! Festa pelas ruas de Paris! A prefeitura e a FIFA promoveram desfiles pelo Champs D´Élysées para reunir todos os torcedores do mundo em um mesmo local! Parecia réveillon em Copacabana! E percebi que várias pessoas circulavam com uma espécie de colar, improvisado com arame ou barbante. Todos com a mesma mensagem: "Compro ingressos para Brasil x Escócia".

Decidi parar um deles. Era um japonês. Do Japão! Perguntei quanto pagava! Mil dólares! Ou seja, o japa pagaria por um ingresso o mesmo que paguei por três!

Aí, em segundos, 24 anos passaram pela minha mente!

1974. Eu tinha 7 anos. Meu primeiro álbum de figurinhas. A primeira Copa transmitida em cores! TV nova lá em casa! Philips 26 polegadas! Era de botão, não mais com aquele seletor redondo. Amigos dos meus pais lá em casa vendo os jogos. Meu pai me exibia. "Osmar, fala pra eles o time da Alemanha! E eu mandava: Mayer, Vogts, Beckenbauer, Schwarzenbeck e Breitner. Bonhof, Overath e Hoeness. Grabowski, Gerd Muller e Holzenbein"! Manda a Holanda agora! É pra já! Jongbloed, Janssen, Rijsbergen, Krol e W. Van der Kherkof, Suurbier, Haan, Cruyff, Rep, Neeskens e Resenbrink". Sucesso Total!

1978. A cada gol que o argentino, naturalizado peruano, Quiroga engolia, a raiva tomava conta do meu ser em estado absoluto! Eu não acreditava naquilo! Vibrei muito com o "campeonato moral" que ganhamos! E torci com todas as minhas forças para a Holanda sem Cruyff na final! Não deu!

1982. A Tragédia do Sarriá. Não quero falar sobre isso!

1986. Foi muito doído ver o Zico perder aquele pênalti. Uma injustiça para um grande craque que chegou a pedir dispensa antes da seleção viajar pois sabia que não estaria 100%, já aos 33 anos!

1990. Uma Copa insossa. Um lance de Maradona foi suficiente para a derrota. E foi nossa melhor partida! Fiquei p... de perder para a Argentina mas, pelo menos, colocou o Lazaroni no ostracismo.

1994. Eu e meu irmão de mãos dadas esperando o pênalti do Baggio. Meu pai, de navio, trabalhando! Estava no Japão! Com a minha mãe! A bola subiu! Fomos para a janela! Gritamos muito! Abraços! Beijos! Finalmente campeões depois de 24 anos! E sem Pelé!

O japonês esperava minha resposta!

As fotos abaixo a revelam! Mil dólares por uma Copa do Mundo? Nem um milhão! Mas ainda bem que o japa não me ofereceu isso...

Reparem no Federation Bresilienne CBF. Será que minha grana foi pro Ricardo Teixeira?!
Lugar horrível mas conheci o então desconhecido ator Dan Stulbach, com chapéu de bobo, à esquerda.
Os tais 24 anos voltaram no Hino Nacional! Não deu para segurar! Mas também lembrei do japa...

2 comentários:

  1. ótimo relato. E com a copa no Brasil, estarei provavelmente vendo os jogos da seleção pela tv...

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  2. Vamos marcar ! Veremos em quem tiver a TV maior!!!! Eh!Eh! Abraço!

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