Uma triste coincidência. Foi só falar na Holanda da Copa do Mundo de 1974 que o melhor lateral-esquerdo desta competição nos deixa muito cedo, aos 62 anos: Marinho Chagas, o "bruxa".
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No ABC, 1970 |
Se Cruyff inovou pela maneira de jogar com o futebol total, Marinho fez o mesmo para a posição em que atuava. Desde que Nilton Santos marcou aquele gol contra a Áustria, na estreia da Copa de 1958, com Vicente Feola gritando "Volta, Volta!", laterais que atacavam em excesso eram condenados por técnicos, imprensa e mesmo por outros jogadores. Sua prioridade era marcar os pontas dos ataques adversários e ir, de vez em quando, ao apoio. Durante a década de 60 e início da de 70, alguns laterais de habilidade e de boa chegada no ataque sofreram com esse paradigma no Brasil: Rildo, Paulo Henrique, Eurico, sem falar de Marco Antonio, deixado na reserva do limitado Everaldo em 70, por Zagalo, pois era ofensivo demais. Por que o convocou então?
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No Botafogo, em 72 |
Novamente no elenco em 74, Marco Antonio, desta vez, não tinha do que reclamar. Mesmo destro, Marinho Chagas era o titular absoluto da lateral-esquerda. Ao chegar no Botafogo em 1972, aos 20 anos, vindo do Náutico e ABC de Natal, impressionou a forma como conduzia a bola, sempre para frente, com passadas largas. Tinha uma jogada característica que, ao chegar no bico da grande área adversária, cortava para o meio e batia de perna direita. Fez vários gols assim. Além dos de falta. Talento de sobra!
Como não dizer que o Brasil da Copa de 74 não tinha craques? Leão, Luis Pereira, Marinho Peres, Piazza, Carpeggiani, Rivelino, Paulo Cézar, Leivinha, Waldomiro, Dirceu, Jairzinho, Ademir da Guia, Edu! Contudo, vítimas do atraso e da arrogância de Zagalo (já deu pra perceber que nunca gostei dele?), apenas Rivelino e Marinho Chagas se destacaram. E após o jogo contra a Polônia, na disputa do 3o.lugar, Marinho e Leão se engalfinharam no vestiário pois o goleiro responsabilizou o "Bruxa" por Lato ter entrado sozinho pelo seu setor e marcado o gol da vitória polaca!
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Na Copa de 1974, passadas largas! |
Era boêmio e vivia na noite carioca com Paulo Cézar. Ambos viviam disputando, no bom sentido, quem era o mais excêntrico: o carro mais "envenenado", as roupas mais "transadas", o cabelo mais maluco, as melhores companhias femininas (os "brotinhos"), quem aparecia mais nas festas e quem bebia o melhor scotch!
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Em 77, no Fluminense |
Ainda jogou no Botafogo até 1976, quando ganhou o Torneio Bicentenario do EUA com a seleção brasileira, e no ano seguinte, Francisco Horta, presidente do Fluminense, não mediu esforços para, na base de seu tradicional "troca-troca", levá-lo às Laranjeiras: Paulo Cézar, Gil e Rodrigues Neto por Marinho, o goleiro Wendell e o apenas esforçado lateral-direito ou zagueiro Miranda. Até 1977, foi titular da seleção, marcando um golaço nas eliminatórias contra a Colômbia, na goleada de 6x0, no Maracanã! Na Copa de 78, preterido pela invenção de Coutinho (Edinho na lateral-esquerda), Marinho herdou a camisa 10 de Rivelino no Fluminense, quando este saiu para a Arábia Saudita, após a Copa! No ano seguinte, já estava ganhando dinheiro no New York Cosmos, com Beckenbauer e Carlos Alberto Torres. Depois, voltou à lateral esquerda no São Paulo, quando conquistou seu único título importante no Brasil: campeão paulista em 1981.
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Em 79, no Cosmos |
Jogaria no Morumbi até 83, quando começou a queda no Bangu, Fortaleza, América de Natal. Os problemas com o álcool só aumentavam e o ostracismo durou por quase duas décadas, quando estava contratado pela TV Bandeirantes de Natal para comentar os jogos da Copa 2014, que serão realizados nesta capital. E no último domingo, os problemas intestinais decorrentes do alcoolismo acabaram derradeiros.
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São Paulo, 1981 |
Não há como duvidar que Marinho Chagas tenha deixado um legado (palavra da moda). Após 74, não houve lateral-esquerdo da Seleção Brasileira que não se destacasse por sua capacidade ofensiva, com habilidade e talento, conferindo-lhes a condição de craque: Júnior, Branco, Leonardo, Roberto Carlos e Marcelo. Júnior, também destro, e Leonardo ainda passaram para o meio-campo, ao longo de suas carreiras. Tal como Marinho! (
O Michel Bastos, do Dunga, foi efetivamente apagado da minha memória!)
Que o "bruxa" tenha espantado todas as bruxas que devem ter atormentado sua vida e tenha, ainda, sorte para marcar o Garrincha nas peladas de São Pedro! Se Nilton Santos se livrou dessa aqui na Terra, imagina lá em cima! Antiguidade é posto!
Alguns times com Marinho Chagas!
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Bola de Prata PLACAR 1972, com Figueroa, Leão, Piazza, Osni, Ademir da Guia e Paulo Cézar. |
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BOTAFOGO 1974 - Miranda, Wendell, Osmar Guarnelli, Brito, Marinho Chagas e Carlos Roberto. Zequinha, Marco Aurélio, Fischer, Jairzinho e Dirceu. |
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Copa do Mundo 1974 - Nelinho, Leão, Marinho Chagas, Luis Pereira, Piazza e Marinho Peres. Jairzinho, Carpeggiani, Leivinha, Rivelino e Edu. |
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Fluminense 1977: Wendell, Miranda, Miguel, Edinho, Pintinho e Marinho Chagas. Luis Carlos, Doval, Rivelino, Rubens Galaxe e Zezé. |
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São Paulo 1981: Valdir Peres, Getúlio, Oscar, Dario Pereyra, Almir e Marinho Chagas. Paulo César, Renato, Serginho, Éverton e Mário Sérgio. |
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